“O cão e o frasco”, de Charles Baudelaire

em 29 de março de 2019

O cão e o frasco






— Meu belo cão, meu cãozinho, meu querido totó, vem cá, vem respirar um excelente
perfume comprado no melhor perfumista da cidade
.
E o cão, agitando a cauda, o que é, suponho, entre esses pobres seres, o sinal
correspondente ao riso e ao sorriso, aproxima-se e, curioso, põe o nariz úmido no frasco
destampado; mas subitamente, recuando de susto, late contra mim, à maneira de reprimenda.
— Ah, miserável cão! se eu te houvesse oferecido um embrulho de excrementos, decerto o
cheirarias com delícia e talvez o tivesses devorado. Assim, ó indigno companheiro de minha triste vida, tu te assemelhas ao público, a quem nunca se devem apresentar perfumes delicados, que o exasperam, mas imundícies cuidadosamente escolhidas.



(BAUDELAIRE, Charles. Pequenos poemas e prosa. Rio de Janeiro, José Olympio, 1950 – trad. Aurélio Buarque de Hollanda. p. 25)

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